quinta-feira, outubro 26

OS DISCRETOS HERDARÃO A TERRA

Com todo esse vai e vem dos computadores, terminei esquecendo de contar aqui o desfecho do caso das baratinhas, mas Mardyta me lembrou. Na verdade foi um final bem previsível e vulgar. Depois de eu e minha faxineira gastarmos inutilmente latas e mais latas de Baygon, como já tinha falado aqui, vi que tinha que ser na base da dedetização mesmo. As baratonas sumiram todas com o Baygon, mas as miudinhas fizeram foi aumentar em número, gênero e grau. Minha mãe me ligou um dia e começou a me dizer o número de uma dedetizadora, eu nem deixei ela terminar, impossível esquecer esse jingle que nos atormentou durante toda a década de 80:

"DA BARATA E DO CUPIM VOCÊ VAI SE LIVRAR,
E DO RATO TAMBÉM, BASTA TELEFONAR:
231-3141... F-GENES DEDETIZAÇÕES... 231-3141... F-GENES DEDETIZAÇÕES..."

Nesse tempo nem tinha ainda o número três como prefixo, vai ver foi por isso que encerraram a longeva campanha, o 3 não coube no ritmo. Liguei portanto 3231-3141. Depois de um curso relâmpago sobre baratinhas e baratonas (as baratinhas miúdas têm hábitos noturnos, se escondem nas frestas, etc.) ao telefone com a atendente, que dada à doçura da sua voz e gentileza de modos fiquei considerando a hipótese de fazer uma pós-graduação em extermínio de baratas, agendei uma visita do exterminador de pragas numa quarta-feira, porque era preciso tirar todas as coisas da cozinha e a minha faxineira vem nas quartas. Nessa manhã do dia determinado, acordei às 10 horas e fui no banheiro. Não ouvi nenhum barulho, portanto a minha faxineira-cozinheira-lavadeira-comadre tinha saído pras compras. Quando fui na cozinha, um dilúvio de um líquido branco e translúcido e uma praga do Egito de baratinhas miúdas mortas tomava todo o chão. Voltei prudentemente para o quarto e voltei a dormir. Quando acordei no início da tarde, o almoço estava pronto e a cozinha, impecável, nem se lembrava que um dia as baratinhas reinaram por lá. O cara ficou de voltar lá na semana seguinte, pra fazer a manutenção com gel nas quinas das paredes pra eliminar as inevitáveis remanescentes. Voltou, botou o gel, deixou a conta pra eu pagar, e assim fechou-se o capítulo das baratinhas. Confesso que sinto falta delas, são boas companhias, discretas e eficientes. Baratas são insetos que admiro, bela cor, excelente design, comem de tudo sem frescura e sem incomodar ninguém, e serão nossas herdeiras na Terra quando finalmente cometermos o tresloucado e atômico gesto. Já as muriçocas eu não perdôo. Não existe coisa mais incômoda e pentelha do que uma muriçoca, uma coisa que zumbe e pica na hora mais pungente, que é a sagrada hora do sono. Graças a Deus, nos últimos três locais que tenho morado elas não me seguiram. Muriçoca: ou foi um erro da criação, ou foi inventada pelo diabo. A diferença entre as baratas e as muriçocas é mais ou menos a diferença entre gatos e cachorros: os gatos são bichos elegantes, discretos e independentes, e os cachorros são bichos desastrados e espalhafatosos, latem à noite, igualmente na hora mais pungente, e não sabem se alimentar sem incomodar o dono. Estou portanto agora sem nenhum animal de estimação em casa. Mardyta, me arranja um filhote de gato?

3 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Arranjo!!! Da família Furriel, alta estirpe.
Mando via sedex 10?

4:50 PM, outubro 26, 2006  
Blogger Mandrey said...

Sensacional texto, meu ídolo! O lance do design das baratas realmente é surreal. Convoco vossa senhoria, do alto da sua sapiência, para participar do projeto "Um Sonho Possível". Passa lá no Mandra Brasa pra ver http://mandrey.blogspot.com

um abraço!

8:00 AM, outubro 27, 2006  
Anonymous Anônimo said...

Rapaz.. Concordo que só Mozart salva. Afe.. Nem brinca. Quando penso que tudo está perdido... Lá vem ele me enchendo as oiças ..

Outra coisa... finalmente botei a mão no febeapá... :P

11:10 AM, outubro 30, 2006  

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