sábado, setembro 8

CABEÇA DE PAPEL

É, esse blog tá realmente muito devagar, mas a culpa não é toda minha e somente minha não: o Goggle tá de sacanagem comigo e nem sempre me deixa entrar, nem com a minha senha nova e nem com a antiga, aí isso vai me tirando os arroubos escrevinhatórios. Acresce que lá no jornal, minha segunda fonte de acesso diário além da minha casa, bloquearam tudo quanto foi de blog, orkut, msn, e tudo o mais que possa distrair o fiel trabalhador do seu digno ofício. Já solicitei dos chefes todos a liberação de acesso do meu blog, consegui, os caras das redes internas liberaram, mas na primeira faxina que fizeram no helpdesk bloquearam de novo por engano. E agora tome burocracia pra desbloquear. Quem ama bloqueiaaa...

Mas já que quase por um milagre consegui entrar aqui hoje, deixa eu contar como foi o meu feriado:

Estava eu me preparando pra cair nos braços de mofudeu, na hora de quase sempre, ou seja, quando a aurora começa a espreguiçar os seus braços cor-de-rosa no lençol azul do céu, e eis que não mais que de repente, bem debaixo da minha janela, soam clarins wagnerianos e metais schoenberguianos, seguidos de percussões nanavasconcelianas e estrondos naçãozumbianos. Primeiro só uns poucos e tímidos, pensei até que era alguma charanga de torcedores bêbados perdida na madrugada, mas imediatamente em seguida ouviu-se uma inacreditável e ensurdecedora algazarra de trompetes, trombones e tambores. Pulei da cama e corri pra janela, e pude ver um fileira de ônibus estacionados e outros tantos que chegavam, trazendo o que parecia ser a convenção anual mundial das bandas escolares, um verdadeiro galo-da-madrugada de bandas marciais de variadas cores, formas e tamanhos, e todas tocando a plenos músculos e pulmões ao mesmo tempo e agora. E eu estou no décimo andar, imagine o susto do coitado que mora no primeiro.

Apesar do marcial caos generalizado, pude contar assim logo de cara umas vinte bandas, se incluirmos a do Exército de Salvação, que, que eu saiba, não é um colégio, e através da faixa de pano que duas garotas seguravam, fico sabendo que é de e não da salvação. Lá vinha uma banda toda de fraque vermelho, e outra que parecia um exército de zangões e abelhas amarelos e pretos, lá vem mais uma de azul-marinho e branco, e finalmente uma de verde patriota, e todas tonitroando a todo vapor, com as infalíveis balizas balizando na frente. Invadiram o parque infantil, a pista de skate, a quadra de esportes, o estacionamento e o posto de gasolina. A do posto de gasolina ensaiava estridentemente uns arranjos com as músicas de Luiz Gonzaga, enquanto as balizas, todas vestidas com uma espécie de uniforme da mulher-maravilha, com botas longas e saias curtas, executavam graciosas coreografias de xaxado. Posso garantir, sem medo de errar, que o vigilante do posto nunca teve um final de expediente tão animado.


Devo estar mesmo ficando velho, pois em vez de me irritar com toda aquela barulheira em pleno amanhecer de um feriado, fiquei foi comovido, me lembrando de como eu era fascinado pelas bandas marciais dos colégios de Timbaúba quando eu era criança. Chegava a freqüentar os ensaios da banda do meu colégio, cuja afinação e exatidão de relógio suíço jamais foi superada por nenhuma outra banda marcial que tenho ouvido pelos setes de setembro vida afora. Não é mero bairrismo, a Banda Marcial do Colégio Comercial Timbaubense ganhou todos os concursos de bandas marciais que participou. Não tinha pra ninguém. Essas aí de baixo que remotamente me deleitavam e certamente infernizavam a vida dos meus vizinhos estavam muito longe de amarrar as chuteiras de Zé Mendes, que era o diretor do colégio e o regente implacável da banda que hoje leva o seu nome. Mas não importava, lá estava eu alinhado e perfilado na fila de novo, pronto para a longa marcha no sol escaldante, com a mãozinha espalmada no coração apertado, vendo as bandeiras do Brasil e de Pernambuco sendo hasteadas ao ruflar dos tambores da saudação inicial aos pavilhões nacionais.



O que aconteceu foi que, vi depois no jornal, como a Conde da Boa Vista, tradicional corredor dos desfiles do Dia da Independência, está em obras, o desfile foi transferido para a Cruz Cabugá, e sendo a Rua da Aurora uma paralela, as bandas acamparam aqui antes de desfilar. Ah, bom, porque nos quase cinco anos que morei no Ébano, que também é Rua da Aurora, nunca ouvi nenhum pio, o feriado de Sete de Setembro passava em brancas nuvens. Devia sobrar pro pessoal lá do Derby e adjacências. Pois esse ano veio tudo com juros e correção, houveram por bem de fazer uma espécide de Praça da Pré-Apoteose no Cais da Aurora, aquecendo os tamborins antes de entrar na avenida. E quando finalmente uma ia desfilar, não tinha refresco, logo duas ou três já ia chegando pra tomar o seu lugar. Impossível sequer pensar em dormir, o jeito foi ficar à toa na vida e ver a banda passar. Lá pras oito da manhã me liga Mandrey, recém-chegado de mudança pra um dos edifícios vizinhos, e me pergunta o que é pior, um telefonema incoveniente numa manhã de feriado ou uma banda marcial no pé-do-ouvido.

-Uma não, trinta! Eu contei!
-Você devia ter me avisado, aí eu só viria depois do feriadão!
-Eu também não sabia, nunca vi isso na minha vida!

Por volta da onze horas a coisa começou a amenizar, foi rareando, rareando, e perto do meio-dia tudo já tinha voltado ao normal, e pude finalmente ir dormir.


Pois eu não sabia, Mandra, e confesso que, se soubesse, ainda assim não avisaria. Eu gostei de ter um amigo bem-humorado pra compartilhar esse momento surreal de cinco horas de batucadas, buzinaços, marchas e coreografias, do qual provavelmente vou sentir saudades quando finalmente consertarem o asfalto da Conde da Boa Vista.

1 Comments:

Blogger Mandrey said...

Só dormi no ponto para comentar aqui. Realmente, Só No Migué, faço minhas as suas palavras, com um pequeno acréscimo-lamento: embora eu more no 16º andar, posso testemunhar com muita putice que lá em casa a gente ouvia um samba do crioulo doido, com pedaços de Luiz Gonzaga misturados com o toque da alvorada daqueles filmes de faroeste (por que será que todo féladaputa que tem um trumpete sempre arranha essa?). E o pior foi ter ficado ilhado, meu velho. A gente até tentou escapar, mas nenhum carro podia deixar a garagem por causa da multidão que ensaiava no nosso pé-do-ouvido. hehehehe FOI FOOODA!

4:50 PM, setembro 11, 2007  

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