segunda-feira, março 5

EU SOU, TU ÉS, ELE É

Eu não sou baiano, mas tenho muita preguiça de "defender o Nordeste" contra preconceitos. Aliás, ando muito preguiçoso de defender qualquer coisa de qualquer preconceito. Por mais que queira, eu não consigo tomar a coisa de modo pessoal. Ontem li no Blog de Jamildo, vide link, um artigo de um jornalista paranaense que, de repente, resolveu publicar um artigo no jornal "Estado do Paraná" fazendo uma análise meio escalafobética do planeta nordestino, desfiando um rosário de clichês e creio eu obrando alguns argumentos de própria lavra, para explicar tintim por tintim porque é que os nordestinos são assim ou assado.

É, planeta mesmo, porque, entre muitas outras descobertas, ele afirma que o Nordeste é um mundo à parte. E o artigo foi publicado no dia 11 de fevereiro de 2007, esse corrente ano em que estamos navegando, no qual até a China está tão integrada ao mundo que dia desses deu um abalo na bolsa de valores do planeta Terra. Deixemos a cada um o julgamento de quanto há de absoluto e de relativo no artigo, mas o fato é que todos nós somos preconceituosos. Faz parte da condição humana. Nós temos essa necessidade básica de agrupar, alinhar e explicar as coisas ao nosso redor. Nos faz sentir mais confortáveis e menos perdidos e inseguros no Universo.

Não estou dizendo que não se deve lutar contra os preconceitos, só estou dizendo que eu tenho preguiça. Porque o preconceituoso geralmente precisa do seu preconceito para poder continuar funcionando. Os preconceitos fazem parte da construção do ego de cada um. E nascem a toda hora e em qualquer lugar, como grama por entre as brechas do asfalto.

Ainda outro dia eu fui preconceituoso com Mardoux, porque teve um tiroteio no Botafogo, bairro em que ela mora no Rio, e eu perguntei se ela tinha sobrevivido. Ela disse que, à parte um congestionamento nas imediações, quase nem tomou conhecimento do fato, a não ser depois pelo inevitável estardalhaço da mídia televisiva. Creio que já contei aqui a minha mancada sendo preconceituoso contra os vietnamitas quando estava nos States. Nesse último post eu também fui preconceituso com os sulistas americanos, que, em relação aos nortistas, são os nordestinos dos Estados Unidos.

Os ingleses são preconceituosos com os Estados Unidos como um todo, os americanos são preconceituosos com o Brasil, os sudestinos com os nordestinos, os pernambucanos com os paraibanos, os recifenses com os caruaruenses, os caruaruenses com os gravataenses, os gravataenses com os chãdealegrienses, os franceses esnobam a todos, e por aí vai. Onde houver poder em jogo, vai haver preconceito do poderoso contra o fraco e do fraco contra o poderoso.

Isso no plano geral, no plano individual nós alimentamos uma miríade de preconceitos que nos ajudam a definir quem somos. Por exemplo, eu não namoraria uma donzela que fosse fã incondicional de carterinha e crachá da Banda Eva. Sinto muito, é que não dá. Dia de show ela ia ter que ir sozinha, aí a relação ia terminar se deteriorando. Esse é um exemplo de preconceito espiritual, vamos aos físicos. Sou muito mais tolerante nessa área, mas teria uma certa dificuldade, digamos, em beijar com paixão uma linda moça sem os dentes da frente. Ou que usasse dentadura: e se a eu engolisse no calor do beijo e morresse engasgado?!?
Tirante isso, e talvez uma monumental obesidade mórbida ou uma gravíssima anorexia esquelética, mijou sentado, num foi sapo, tou comendo.

E voltando ao plano geral, talvez os leitores paranaenses do tal jornalista se sintam confortáveis em saber que são superiores a alguém nesse país, uma vez que certamente devem se sentir um pouco inferiores aos paulistas, que moram num estado mais rico e mais próspero. Os paulistas, por sua vez no topo da cadeia alimentar, mandam as suas crianças para o colégio no São João vestidas de cowboys e no Carnaval promovem um Mardi Gras de New Orleans, com bandinha de jazz tradicional e tudo.

Toda essa arenga me lembra o cartum do cara que leva um esporro do patrão, chega em casa briga com a mulher, a mulher dá um cascudo no filho mais velho, o filho mais velho bate no mais novo, o mais novo bate na irmã caçula e a irmã caçula chuta o cachorro e o cachorro morde o gato.
Portanto, na minha humilde porém sincera opinião, isso de querer acabar com os preconceitos regionais é como querer pegar o vento com a mão. Na maior parte das vezes, trata-se de politicagem hipócrita para inglês ver, delírios transcendentais coletivos ou de mero provincianismo mesmo.

1 Comments:

Blogger Mandrey said...

....esse gato, mordido pelo cachorro, seria por acaso um felino chãdealegriense?

9:42 AM, março 06, 2007  

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